Do litoral aos morros, o povo da zona sul resiste à pandemia

Texto produzido por Livroteca Brincante do Pina, Centro Mário Andrade e Mapa Solidário

Comunidade do Bode, no Pina

O paredão de prédios da beira-mar antagoniza com a precariedade dos bairros da Zona Sul do Recife. Se já era evidente o contraste entre o bem-estar da elite e a falta de recursos das comunidades vizinhas, ele se acentua com o isolamento social. A necessidade de sair para trabalhar e a falta de serviços públicos básicos, neste momento, são atenuadas pela luta de iniciativas comunitárias. 

“De quarentena, mas Solidários” 

O bairro do Ibura, de grande extensão territorial, abrange cerca de 50 mil habitantes. Tem como característica escadarias e morros, que dificulta o acesso ao transporte público. Além disso, é o local com maior ocorrência de tiroteios na cidade do Recife, segundo balanço do aplicativo Fogo Cruzado da UFPE. Lá, o Centro Comunitário Mário Andrade atua há mais de 4 anos no enfrentamento e combate ao genocídio do povo preto, prestando assistência às famílias em ações socioculturais gratuitas à comunidade. O Centro tem ampliado sua rede de atendimento à população em tempos de pandemia com a campanha “De quarentena, mas solidários!”.

Até o momento, a campanha atingiu mais de 200 famílias residentes no Ibura. Mais de 80% das pessoas atendidas são negras, em sua maioria mulheres, geralmente mães solo responsáveis pelo sustento familiar cuidado com os filhos. Cerca de 20% delas recebem até um salário mínimo, aproximadamente 24% não possuem nenhuma renda e por volta de 50% estão inseridas no Programa Bolsa Família. 

#CoronaNasPeriferias

Já na Comunidade do Bode, a iniciativa da Livroteca Brincante do Pina está com a Campanha #CoronaNasPeriferias, junto ao Co letivo Pão e Tinta. Para evitar a proliferação do vírus na Comunidade, onde grande porcentagem dos moradores ainda mora em palafitas, com saneamento básico quase zero e difícil acesso à informação, os coletivos vêm orientando sobre os perigos do COVID-19. As ações já beneficiaram em torno de 300 famílias. No bairro, moram muitas mulheres e homens que trabalham informalmente como pescadores e marisqueiros e vivem exclusivamente da pesca – que está afetada por conta da pandemia. Para agravar a situação, ainda pairam desconfianças sobre a atividde por causa do derramamento de óleo que atingiu o Nordeste. 

É difícil falar sobre ficar em casa quando alguém divide um pequeno cômodo com várias outras pessoas ou precisa continuar trabalhando para sustentar sua família. Mas é dividindo estas experiências que moradores e movimentos se organizam para trabalhar coletivamente. A Livroteca – uma biblioteca comunitária que antes se dedicava a projetos de incentivo à leitura, integração artística, cultural e ambiental – e o Coletivo Pão e Tinta – grupo que inicialmente se reúne no evento anual de revitalização sociocultural – neste momento de pandemia colaboram distribuindo materiais de limpeza, cestas básicas, máscaras, dentre outros.

Solidariedade para resistir ao COVID-19d

Entrega de alimentos no Centro Mário Andrade, Ibura de Baixo

Em seu sentido mais abrangente, o direito à saúde é relacionado às condições de alimentação, habitação, saneamento, educação, meio ambiente, trabalho e renda. Se estas condições são negadas sistematicamente a certos bairros, então temos um quadro de violação cotidiana de direitos humanos na vida destes moradores. Diz-se “populações periféricas” não apenas por estarem longe de um “centro”, mas por terem negadas as condições básicas de desenvolvimento, sendo empurradas à exclusão social. 

Na resistência a estes estigmas, os coletivos contam com a solidariedade de todes para minimizar os impactos sociais causados pela pandemia do coronavírus. É necessário garantir imediatamente o direito básico de alimentação. As mortes em virtude do Covid-19 continuam e, sem apoio mútuo e solidariedade, o povo pobre será ainda mais atingido. 

Junte forças aos coletivos:
Campanha #CoronaNasPeriferias, no Pina | Campanha De quarentena, mas solidários, no Ibura