Partilhar para ver brotar – Campanha para ampliação do Sítio Ágatha

O Sítio Ágatha é um espaço agroecológico formado por 3 gerações de mulheres negras: Luíza, Nzinga e Ágatha. Depois de 8 anos de muita luta e resistência, elas conquistaram a terra onde aos poucos foram construindo o sítio. Desde o começo, o espaço conta com a cooperação de muita gente. Seja através dos mutirões agroecológicos, seja servindo de moradia, seja através do acolhimento que realiza.  As pessoas que já colaboraram ou colaboram com o sítio são incontáveis. Porque, é como se todos que por ali passam, se sentissem um pouco atraídos pela possibilidade de ter um modo de vida diferente: plantar, colher, trocar afetos. E assim, o Sítio Agatha foi se tornando um sonho coletivo, ofertado por essa família e acolhido por todas e todos que são atraídos pela ideia de viver diferente, respirar ar puro, gerar novas formas de vida e acompanhar seu florescimento. 

Com essa ideia de que todas e todos fazemos parte do sítio é que surge a essa campanha. Se todo mundo que já se conectou com o sítio ou deseja se conectar com essa proposta de vida, ou quer fortalecer essa iniciativa tão potente, puder contribuir, logo a gente vê esse sonho tomar forma! Podemos enxergar cada contribuição dada como um tijolo pra ver esse sonho se materializar! Vamos juntos?

A proposta dessa etapa da campanha é levantar o teto da construção que já foi começada.  A casa de taipa que foi feita em mutirão há 14 anos está desabando. Luiza precisa de um novo espaço onde acolher mais e mais pessoas de forma confortável. O sonho futuro é construir mais dormitório em cima. Uma construção bem grande que vai caber todo mundo feliz! 

Vamo fazer essa oferta pra fazer esse sonho ir se tornando realidade e tu mesmo poder aproveitar depois? Que tal?

Apoie com doações através da vaquinha <3

Mulher recebendo doação na comunidade da Várzea

Mulheres negras: o alicerce da resistência à pandemia

Fotografia de Cecília da Fonte

O governo está escondendo os dados sobre o número de infectados e falecidos pelo COVID-19, mas há outros dados que, desde o começo da pandemia, estão ocultos: o impacto do trabalho comunitário no enfrentamento ao coronavírus. Menos falado ainda é o papel das mulheres negras neste momento. Parte da população pobre, a mais afetada pela pandemia, estas mulheres estão cuidando da família, da casa, dos doentes e correndo atrás do sustento. Quando não estão ainda mais atarefadas ajudando as comunidades em que moram a resistir coletivamente através de campanhas de doação e distribuição de alimenos e itens de higiene.  

Engajadas no mapeamento e propaganda das ações de solidariedade, as colaboradoras do Mapa Solidário, agregador de campanhas em Pernambuco, entrevistaram mulheres negras que atuam em suas comunidades na Região Metropolitana do Recife. Além da exposição de informações sobre a saúde pública, é importante mostrar a batalha diária dessas lutadoras em ações de apoio mútuo em seus territórios. A mulher negra é, sem dúvida, protagonista no enfrentamento ao COVID-19.  

Entrevistamos Flávia (Marcha Mundial de Mulheres/Ocupação 15 de Novembro), Joelma (Centro Mário Andrade/Ibura), Joice (GRIS Solidário/Várzea), Liliana (Rede de Mulheres Negras/Córrego do Euclides) e Sarah (Caranguejo Tabaiares Resiste/Caranguejo Tabaiares), a quem agradecemos por arranjarem um tempo de onde não tinham para contribuir com este texto. 

ANTES E DURANTE DA PANDEMIA 

Comunidade de Caranguejo Tabaiares, Centro do Recife

Durante a pandemia, velhos problemas conhecidos do movimento feminista e de mulheres negras se intensificaram. Violência doméstica, falta de infra-estrutura e acesso a serviços públicos e sobrecarga nos trabalhos domésticos são alguns deles. Pra piorar, o desemprego e a fome aumentaram nas comunidades e pioraram a já precária estrutura de vida das famílias. Para Joelma, “a principal questão é o desemprego que depois da pandemia piorou muito”. Liliana ouviu “relatos de trabalhadoras e trabalhadores que foram afastados porque o patrão simplesmente disse ‘não dá pra pagar você, vai ter que aguardar e pronto'”. O isolamento impactou diretamente na renda, já que “muitas [mulheres] trabalhavam de maneira autônoma, seja na venda de produtos, seja com diárias, lavagem de roupa, costura, vendas de cosméticos e faxinas”, diz Joice. Em Caranguejo Tabaiares, muitas “iam para o sinal vender coisas para se manter e hoje não tem condições,” aponta Sarah. 

Por mais que uma parte da população consiga, é muito difícil manter isolamento quando na sua comunidade e na sua casa a pandemia acentuou a precariedade da vida. “É um estado permanente de vulnerabilidade social, óbvio que com a pandemia aumentou”, diz Flávia. Por exemplo, “como se higieniza sem água e sabão e, sobretudo, como se fica em casa sem alimentação?”, completa. Para Liliana, “você fazer quarentena num espaço muito pequeno, com crianças, com pessoas da família que não tem condições de ficarem dentro de casa” é uma dificuldade para as mulheres.   

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER 

Nas comunidades, a questão da violência doméstica não mudou. Como os agressores – geralmente homens – permanecem mais tempo dentro de casa, a fome e o desemprego acabam sendo um álibi. Liliana nos repassou relatos de “xingamentos, grosserias e violência psicológica, a pressão por botar comida dentro de casa sem ter condições”, além da jornada triplicada dentro de casa com as crianças sem aula. Joelma relata o caso de uma moça que precisou mudar-se de bairro para fugir das agressões: “Nesse contexto que estamos não tem como se resolver nada, então ela preferiu realmente sair daqui da comunidade com medo disso, a gente já teve caso de [feminicídio] aqui por isso, de ex marido”. Joice acrescenta que a subnotificação aumenta por conta do isolamento social, que diminui o acesso às delegacias especializadas pela dificuldade no deslocamento e pelo medo da convivência com o agressor. Além disso, “a cotidiana violência policial chega sempre de forma agressiva na comunidade”, ressalta Flávia. A desconfiança diante dos dados oficiais que apresentam uma diminuição dos casos de violência contra a mulher soma-se à ausência de acompanhamento às famílias pelos postos de saúde nos bairros, como nos lembra Sarah. 

O PAPEL DA MULHER NEGRA NAS LUTAS COMUNITÁRIAS

 

Ação no Centro Mario Andrade, no Ibura

Por serem um dos grupos mais impactados pelo COVID-19, as mulheres negras são também as primeiras a se mexer. Seja no Ibura, Córrego do Euclides, Várzea, ou qualquer outro território periférico, são as mulheres que se organizam para cuidar das suas comunidades e das suas famílias. “Elas se organizam em pequeno grupos, identificam quem são as que mais precisam, arrecadam material de limpeza, alimentos e máscaras e organizam a distribuição, seguindo todos os cuidados dados pela autoridades de saúde”, explica Flávia. Para além de todas as ações práticas que envolvem o ato de cuidar, as mulheres muitas vezes se encontram na função de equilibrar o estado emocional das pessoas do lar. Liliana deixa negritado que são as mulheres que atentam para que todes façam uso da máscara, lavem as mãos além dos outros protocolos básicos de higiene.  

Como sempre, a mulher negra é empurrada a ser responsável pelo bem estar das pessoas ao seu redor. “São elas que se articulam para conseguir as cestas básicas, mesmo que não carreguem o peso, elas que ficam nas filas e vão atrás, também no que diz respeito à saúde: se tem alguém doente em casa são elas que vão nos postos de sáude obter informações, ir atrás de remédios etc”, explica. Joelma ressalta que enquanto as mulheres se movimentam, os homens além de não marcarem presença nas ações solidárias, se expoem de forma desnecessária, levando para dentro das suas casas o vírus. “De 5h, 6h da manhã a avenida principal tá cheia de cara tudo sem fazer nada, batendo papo. Quem está fazendo os corres pra manter o sustento da família são as mulheres”, diz ela. 

Não podemos precisar por quanto tempo a pandemia do COVID-19 ainda impactará as nossas vidas e comunidades, mas uma coisa é certa: as mulheres negras não podem seguir sendo o alicerce de tudo ao seu redor sozinhas. Precisamos encontrar formas de redistribuir coletivamente as funções que elas exercem, além de exigir do governo a estrutura devida no que diz respeito à saúde e à assistência social a essas comunidades. Dos Governos e Empresários não esperamos nada, apenas exigimos o que é nosso. Mas é das pessoas próximas que esperamos uma mudança solidária que ande ombro a ombro com a libertação da mulher negra até atingirmos uma sociedade livre do capitalismo, do racismo e do machismo. 

Naomi e suas Filhas, 2013. Fotografia de: Kehinde Wiley, cortesia da Galeria Stephen Friedman Gallery. Reprodução da Publicação no The Guardian